Quando a qualidade não basta: bons filmes que foram ignorados pelo público e/ou pela crítica

Júlia Costa
6 min readApr 19, 2018

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Tendo em vista que todos os anos estreiam milhares de produções audiovisuais e que somente aquelas com grandes orçamentos chegam à maior parte do público, torna-se humanamente impossível acompanhar a tudo. Dessa forma, até mesmo o cinéfilo mais assíduo acaba por perder, no mínimo, centenas de bons títulos por temporada.

Sabendo disso, compartilho e recomendo alguns filmes que percebi não terem sido tão comentados quando lançados — sendo, assim, esquecidos pelo público ou até mesmo pela crítica — , mas que me surpreenderam positivamente e que, por isso, acredito merecerem uma chance de serem vistos.

Alguns não chegam exatamente a ser considerados desconhecidos, mas todos possuem em comum o fato de não terem o merecido reconhecimento — digo isso a partir da minha opinião e experiência pessoal, por meio de conversas com amigos, e também do Letterboxd, site utilizado nessa pequena pesquisa informal.

Sem mais delongas, vamos às indicações.

Blue Jay (2016)

De todos desta lista, Blue Jay certamente é o meu filme favorito e, para mim, o melhor produzido pela Netflix. O longa conta a história de dois ex-namorados de tempos de colégio que se reencontram de forma completamente inesperada, em um supermercado na cidade onde moravam, e decidem passar o resto do dia juntos.

A forma como o relacionamento dos dois vai se (re)desenvolvendo é muito natural, o que é mérito do roteiro impecável de Mark Duplass, além das atuações deste último e de Sarah Pulson. Além disso, a escolha pela estética em preto e branco foi um acerto, dando uma amostra da melancolia que tomou conta da vida dos personagens conforme estes amadureceram.

Cena do filme na qual os personagens principais passeiam pela cidade onde viveram sua adolescência e também um relacionamento. O filme é dirigido por Alexandre Lehmann.

Tive contato com a película a partir de uma crítica feita por Pablo Villaça, e, apesar dos elogios feitos por ele, fui assisti-la sem muita expectativa. Todavia, acabei me surpreendendo ao encontrar um filme extremamente sensível, realista e imersivo, que consegue proporcionar ao espectador uma experiência que é ao mesmo tempo agradável e dolorosa.

O mais impressionante, no entanto, é que ao comentar sobre o filme com alguns amigos, descobri que nenhum deles o conhecia, o que é um absurdo, levando em consideração que tantas outras produções da Netflix de qualidade no mínimo duvidosa são amplamente divulgadas pela empresa de streaming. Nesse contexto, chega a ser triste ver um filme maravilhoso como Blue Jay não receber a devida divulgação e reconhecimento. Por isso, na tentativa de fazer com que esse filme seja ao menos um pouquinho mais enaltecido, é esta a minha maior recomendação de hoje.

Hope (2013)

Hope é devastador e provavelmente emociona grande parte das pessoas que o assistem. Nele, uma criança de apenas 8 anos, ao fazer o seu caminho para a escola, é violentada e quase morta por um indivíduo que morava nas proximidades. A partir de então, será desafiada a superar os danos físicos e psicológicos causados em decorrência da violação sofrida.

Dir: Lee Joon-ik

Infelizmente, o filme acabou sendo negligenciado pela crítica e pelos espectadores. Apesar da nota alta no IMDB, Hope possui somente uma review feita por um crítico reconhecido no Rotten Tomatoes. O público também não mostrou calorosa receptividade: o filme foi visto por uma quantidade mínima de membros de plataformas como Letterboxd, Rotten Tomatoes e Filmow (na data de publicação deste texto, o filme havia sido assistido por menos de 1400 usuários do letterboxd. Os índices dos outros sites citados são semelhantes).

Talvez a baixa audiência, ao menos no Brasil, se dê por se tratar de uma produção coreana, tendo em vista que, infelizmente, filmes que não são europeus ou norte-americanos dificilmente possuem a mesma visibilidade que aqueles. De qualquer forma, independentemente do motivo que gerou o relativo desconhecimento a respeito do filme, ressalto que vale a pena assisti-lo, pois, o fazendo, além de encontrar uma produção de qualidade, o espectador poderá prestigiar o cinema produzido fora do eixo Estados Unidos-Europa, o que por si só é enriquecedor.

A Ghost Story (2017)

Primeiramente, aviso que este é o filme mais “ame ou odeie” dessa lista, e que não o recomendo para quem não gosta de longas que têm um ritmo mais lento. Mas, para quem não tem problema com isso, e quer uma experiência cinematográfica que faça refletir por dias após ter sido vivida, A Ghost Story é uma escolha certeira.

Dir: David Lowery.

Ao falar sobre uma mulher (Rooney Mara) que perde seu marido (Casey Affleck), o filme aparenta tratar sobre um assunto — o luto — , mas abrange muito mais. Tempo, esquecimento, relacionamentos, existencialismo, superação: esses são alguns dos temas que acabam sendo abordados de uma forma muito sutil, mas que atinge o espectador de maneira forte.

Não acredito que este seja o caso de um filme ignorado pela crítica, tendo em vista que a obra é bem avaliada pelo IMDB e por outros. Alguns críticos, inclusive, apostaram que este poderia até mesmo ser indicado ao Oscar em 2018, o que acabou não se concretizando, pois, chegando o momento das campanhas, a A24 (sua produtora) escolheu apostar em outros nomes — escolha que, apesar de prejudicar ao filme a que me refiro, foi razoavelmente sensata, considerando que a produtora tinha na manga obras também excelentes como Get Out e Lady Bird.

Ao público, porém, o filme não alcançou da forma como poderia, não tendo recebido a visibilidade que viria com a possível indicação ao Oscar. Desse modo, estreado em 2017, A Ghost Story já corre o risco de entrar injustamente para a lista dos relativamente “desconhecidos” — ou, ao menos, dos não tão conhecidos quanto deveriam.

Following (1998)

Por ser dirigido por Christopher Nolan, poder-se-ia até mesmo estranhar a presença de Following em uma lista de filmes que não tiveram muito destaque. Isso acontece porque o filme em questão foi o primeiro da carreira do diretor, sendo assim produzido quando Nolan ainda não tinha nenhum tipo de prestígio — eu mesma só descobri a existência do longa quando me comprometi a assistir toda a filmografia do diretor, em 2017.

Na verdade mesmo após a consagração de Nolan como um diretor competente, Following não passou por um processo significante de redescoberta, sendo, ainda, um filme pouco conhecido.

Dir: Christopher Nolan

A película se passa em Londes, e conta a história de Bill (Jeremy Theobald), um jovem escritor desempregado que adquiriu o estranho hábito de seguir pessoas aleatórias que via pelas ruas, na tentativa de encontrar inspiração para escrever e caracterizar seus personagens. Quando um de seus alvos de perseguição o confronta, e o convence a acompanhá-lo na prática de algumas invasões e furtos à residências, a vida de Jeremy toma um rumo distinto do planejado.

Apesar do orçamento baixíssimo, Following não decepciona, compensando essas e outras deficiências com um roteiro muito bem amarrado. Para quem admira o trabalho do diretor, é muito interessante observar como este fez experimentações de uma estrutura narrativa não-linear (com direito a muitos plot-twists), que seria utilizada em vários de seus filmes posteriores e caracterizaria, em partes, o seu estilo. Todavia, mesmo para quem não acompanha ou não possui apreço especial a Christopher Nolan, Following é uma boa opção de filme, sendo esta a última indicação de hoje.

Listar filmes “desconhecidos” é sempre um desafio, tendo em vista que, as vezes, o que é desconhecido para mim não o é para outras pessoas mais aprofundadas do que eu em determinado gênero. De qualquer forma, espero ter apresentado ao menos um título que cada leitor desse texto não conhecia. E, claro, espero que gostem das recomendações.

Deixem nos comentários o que acharam dos filmes, se já os conheciam, ou outros que adicionariam a essa lista. :) Para quem também usa, esse é link do meu letterboxd: https://letterboxd.com/juliacosssta/

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Júlia Costa

Direito, cinema, política, cultura pop, marxismo e aleatoriedades